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APF cria mural de causas no Intendente

A Associação para o Planeamento da Família convidou os artistas Fidel Évora e Tamara Alves a criarem um mural dedicado às mulheres, em especial às sobreviventes de Mutilação Genital Feminina (MGF). O resultado pode ser visto a partir do dia 1 de Julho no Largo do Intendente em Lisboa, onde nasceu uma obra que reafirma o muralismo enquanto expressão privilegiada à sensibilização do público através da arte e o espaço urbano como um contexto ideal à partilha de causas sociais.   

A APF reuniu artistas, convidados e parceiros para a apresentação pública do Mural END FGM, num encontro que contou com os testemunhos de Aissato Djaló, do Projeto Musqueba, de Miguel Areosa Feio, Coordenador de projetos da APF, e de João Lavinha, da Direção da APF. O Mural END FGM pretende sensibilizar o público português para a realidade da MGF, destacando os efeitos positivos que as migrações e o multiculturalismo podem ter em termos de mudança de mentalidades e de comportamentos, com impacto alargado à prevenção junto das comunidades e populações em risco. A obra foi criada no âmbito da campanha europeia END FGM (Female Genital Mutilation), que advoga a atuação enérgica do Parlamento Europeu na erradicação desta prática e que em Portugal é representada pela APF.

Os artistas Fidel Évora e Tamara Alves iniciaram os trabalhos no mural durante o evento “JUNTOS na partilha de culturas e causas”, que a APF promoveu nos dias 5 e 6 de junho na Casa Independente. Dedicado ao esclarecimento e à sensibilização em torno das práticas tradicionais nefastas, JUNTOS reuniu peritos, técnicos e membros de comunidades imigrantes, em especial da Guiné-Bissau, país onde, de acordo com dados da UNICEF, existe uma prevalência de 50% de mulheres e meninas sobreviventes de MGF. Um dos momentos mais marcantes do encontro foi o comovedor testemunho de Aissato Djaló, representante do Projeto Musqueba para a capacitação das mulheres africanas, portuguesa de origem guineense e sobrevivente de MGF. No mural pode ler-se a inscrição “dedicado à Aissato Dajaló e a todas as mulheres, em especial às que são sobreviventes de Mutilação Genital Feminina”, prestando assim homenagem à coragem desta ativista que luta pela defesa dos direitos das mulheres guineenses.

Sobre o Mural END FGM e os artistas:

Fidel Évora e Tamara Alves assinam o Mural END FGM, uma obra desenvolvida a duas mãos e onde distintas linguagens artísticas se intersetam para uma composição plena de energia e sensibilidade, que aborda a MGF como um problema transversal a todos, independentemente do género ou nacionalidade. O mural estende-se pela fachada do edifício do Sport Clube Intendente, onde quatro portas cegas emolduram ou encarceram corpos femininos, masculinos e híbridos. Uma prisão que só é interrompida por ramos de rosas do deserto, o elemento que os artistas elegeram para simbolizar a luta das mulheres pela sua emancipação. O Mural END FGM foi concretizado com o apoio da Câmara Municipal de Lisboa – Galeria de Arte Urbana (GAU).

Fidel Évora é natural de Cabo Verde, formou-se em Design Gráfico na ETIC e trabalha em Lisboa, onde conjuga a actividade artística com a ilustração e o design. O imaginário e a simbologia africana são constantes no seu trabalho, seja na estilização do traço que remete para o corte limpo das máscaras tribais, seja no desenho de pormenor e no tratamento de texturas, executados minuciosamente, camada a camada, como se da trama de um rico adereço ou de um paramento cerimonial se tratasse. Valoriza a figura humana, os rostos e os perfis em composições de contornos bem definidos, que explodem em contrastes e camadas de cor, criadas habitualmente sobre fundos neutros. O trabalho de Fidel transporta-nos para um universo onírico muito pessoal, expresso na interseção entre o ser português e as múltiplas manifestações da africanidade, há muito incorporada pela Pop e que atualmente se manifesta em todas as dimensões da cultura contemporânea.

Tamara Alves é natural do Algarve, vive e trabalha em Lisboa. É a expressão feminina da street art portuguesa, condição que transcende o seu género, apesar de ser uma das poucas mulheres com trabalho regular e de relevo neste universo. A figura e a vivência feminina são as suas principais matérias-primas e sejam quais forem os seres – humanos ou animais – que intersecta nos seus desenhos, neles transparecem sempre intensidades e emoções intrínsecas à mulher. Para Tamara a sensibilidade é um instrumento de trabalho e uma arma voraz que atinge o espectador com composições em movimento, que se constroem e destroem na fluidez orgânica de cada traço e a cada novo olhar. À emergência da representação e das linhas espontâneas, que resultam do contexto que a artista privilegia para a apresentação do seu trabalho – o espaço público, adiciona um rigor técnico extremo e um tratamento do detalhe que confere aos seus desenhos, cenários e personagens, uma força ímpar que advém da sua aparente fragilidade.